quarta-feira, 22 de março de 2023

COMPREENSÃO ADVENTISTA SOBRE A NATUREZA DA BÍBLIA

 COMPREENSÃO ADVENTISTA SOBRE A NATUREZA DA BÍBLIA 

Os adventistas do sétimo dia defendem a Bíblia como a única revelação da vontade e plano de Deus para a humanidade. Aceitam-na como a infalível e normativa autoridade para definir crenças e práticas. Creem que nesse livro Deus oferece à humanidade os conhecimentos necessários à salvação.

A primeira Crença Fundamental da Igreja Adventista do Sétimo Dia apresenta uma declaração concisa da crença da igreja sobre a Bíblia: "As escrita e dada por inspiração divina por intermédio de santos homens de Deus que falaram e escreveram ao serem movidos pelo Espírito Santo. Nessa Palavra, Deus transmitiu ao homem o conhecimento necessário para a salvação. As Escrituras Sagradas são a infalível revelação de Sua vontade. Constituem o padrão de caráter, a prova da experiência, o autorizado revelador de doutrinas e o registro fidedigno dos atos de Deus na história."

Essa Crença Fundamental mostra que os adventistas concordam com os outros cristãos conservadores no particular de que a Bíblia é divinamente inspirada e contém a infalível revelação da vontade de Deus para nossa vida. Eles aceitam plenamente a autoridade divina e a completa fidedignidade das Escrituras, embora jamais tenham defendido a doutrina da inerrância bíblica

Objeções adventistas à inerrância absoluta

Os adventistas não endossam a doutrina da inerrância da Bíblia por cinco razões importantes. Primeiramente, os adventistas creem que os escritores da Bíblia foram os autores de Deus, e não a pena do Espírito Santo. Eles estiveram totalmente envolvidos na produção de seus escritos. Alguns deles, como Lucas, reuniram as informações entrevistando testemunhas oculares do ministério de Cristo (Lc 1:1-3). Outros, como os autores de Reis e Crónicas, fizeram uso dos registros históricos de que dispunham. O fato de tanto os escritores como as suas fontes serem humanos, torna irrealista insistir na tese de que não existem declarações inexatas na Bíblia.

Em segundo lugar, as tentativas dos inerrantistas de conciliar as O O discrepâncias entre as descrições bíblicas do mesmo acontecimento resultam, muitas vezes, em interpretações distorcidas e forçadas da Bíblia. Harold Lindsell tenta, por exemplo, conciliar os relatos divergentes da negação de Jesus por parte de Pedro ao cantar do galo propondo que Pedro negou Jesus num total de seis vezes!31 É possível evitar essas especulações gratuitas simplesmente aceitando a existência de discrepâncias irrelevantes nos relatos dos Evangelhos.

Em terceiro lugar, ao basear a fidedignidade e a infalibilidade da Bíblia na exatidão de seus pormenores, a doutrina da inerrância ignora que a função principal das Escrituras é a de revelar o plano de Deus para a nossa salvação. A Bíblia não tem a pretensão de nos fornecer informações geográficas, históricas ou culturais exatas, mas tão somente de nos revelar como Deus nos criou perfeitamente, nos redimiu completamente e há de finalmente nos restaurar.

Em quarto lugar, os adventistas entendem que a doutrina da inerrância da Bíblia não possui fundamento bíblico. Os escritores bíblicos jamais reivindicaram ser inerrantes em suas declarações. Esse conceito tenta tomar como ponto de partida a inspiração divina. Parte do pressuposto de que, se a Bíblia é divinamente inspirada, então deve ser igualmente inerrante. Mas a Escritura jamais equipara inspiração com inerrância. A natureza da Bíblia deve ser definida dedutivamente, isto é, considerando todos os dados fornecidos pela própria Bíblia, e não indutivamente, ou seja, extraindo conclusões de premissas subjetivas. Uma análise dedutiva das discrepâncias existentes na Bíblia não favorece a tese da inerrância absoluta. 

O papei humano na produção da Bíblia

Uma última razão por que os adventistas rejeitam a doutrina da inerrância da Bíblia é o reconhecimento do papel humano na produção da Bíblia. "A Bíblia aponta a Deus como seu autor; no entanto, foi escrita por mãos humanas, e no variado estilo de seus diferentes livros apresenta as características dos diversos escritores. As verdades reveladas são todas dadas por inspiração de Deus (2Tm 3:16); acham-se, contudo, expressas em palavras de homens. O ser infinito, por meio de Seu Santo Espírito, derramou luz na mente e no coração de Seus servos."

De modo contrário à Declaração de Chicago Sobre a Inerrância da Bíblia, segundo a qual a Bíblia foi "verbalmente dada por Deus", os adventistas creem que o Espírito Santo impressionou os escritores da Bíblia com pensamentos, e não com palavras. "Não são as palavras da Bíblia que são inspiradas, mas os homens é que o foram. A inspiração não atua nas palavras do homem ou em suas expressões, mas no próprio homem, que, sob a influência do Espírito Santo, é possuído de pensamentos."

Deus inspirou os homens, e não suas palavras. Isso significa que a Bíblia "não é a maneira de pensar e se exprimir de Deus. Essa é da humanidade. Deus, como escritor, não Se acha representado. Os homens dirão muitas vezes que tal expressão não é própria de Deus. Ele, porém, não Se pôs à prova na Bíblia em palavras, em lógica, em retórica. Os escritores da Bíblia foram os instrumentos de Deus, não Sua pena".

Os adventistas do sétimo dia reconhecem que existem discrepâncias ou imprecisões na produção da Bíblia e na transmissão de seu texto. "Alguns nos olham seriamente e dizem: 'Não acha que deve ter havido algum erro nos copistas ou da parte dos tradutores?' Tudo isso é provável [...], [mas] todos os erros não causarão dificuldade a uma alma, nem farão tropeçar os pés de alguém que não fabrique dificuldades da mais simples verdade revelada."

A existência de erros na produção ou transmissão do texto bíblico só é problema para aqueles que desejam "fabricar dificuldades da mais simples verdade revelada". O certo é que o fato de existirem detalhes imprecisos não enfraquece a validade das verdades fundamentais reveladas na Escritura.

O caráter divino e humano da Bíblia

Os adventistas baseiam sua doutrina sobre a natureza da Bíblia em dois importantes versículos: "Toda a Escritura é inspirada por Deus" (2Tm 3:16) e "nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo" (2Pe 1:21). Esses versos enfatizam a natureza divino humana da Bíblia. Embora tenham sua origem em Deus, as mensagens dos escritores bíblicos foram expressas em linguagem humana, refletindo a formação cultural e educacional dos escritores.

Reconhecer a natureza divino-humana da Bíblia exclui as duas concepções equivocadas sobre a Bíblia que discutimos neste capítulo. A primeira é a dos inerrantistas. que superestima a dimensão divina da Escritura e subestima a participação humana, a fim de legitimar a ideia de que o texto é completamente isento de erros.

A segunda concepção, liberal, é a dos críticos, segundo os quais os escritos bíblicos refletem apenas ideias e aspirações humanas. Para eles. esses escritos são produto de indivíduos de extraordinária capacidade intelectual e religiosa, que foram influenciados, não pela inspiração do Espírito Santo, mas pela cultura de seu tempo.

Os adventistas rejeitam ambas as concepções, ou seja, tanto a dos inerraiitistas como a dos críticos liberais. Em vez disso, defendem uma concepção equilibrada, alicerçada no próprio testemunho da Bíblia (2Tm 3:16; IPe 1:21) acerca de seu caráter divino-humano.

O livro Nisto Cremos afirma: "Existe um paralelismo entre Jesus feito carne e a Bíblia: Jesus combinou em Si Deus e o homem; o divino e o humano se tornaram Um. De modo similar, a Bíblia também reúne o divino e o humano em um só. O mesmo que foi dito de Cristo, pode ser afirmado da Bíblia: 'o Verbo Se fez carne e habitou entre nós' (Jo 1:14). Essa combinação divino-humana faz com que a Bíblia assuma um lugar absolutamente singular na literatura." 

A dimensão humana da Bíblia

Pode-se ver a dimensão humana da Bíblia, por exemplo, no emprego do grego koiné, que era a língua do mercado, em vez do uso do grego da literatura clássica. Revela-a também o estilo literário árido de livros como o Apocalipse, que apresenta vocabulário limitado e alguns erros gramaticais. Está presente no aproveitamento de tradições orais por homens como Lucas, ou de registros escritos pelos autores de Reis e Crónicas. Reflete-se na expressão das emoções humanas, em textos como o Salmo 137, que, descrevendo o sentimento dos cativos hebreus em Babilónia, exclama: "Filha da Babilónia, que hás de ser destruída, feliz aquele que te der o pago do mal que nos fizeste. Feliz aquele que pegar teus filhos e esmagá-los contra a pedra" (SI 137:8, 9).

Essa forma violenta de linguagem expressa emoções humanas magoadas, mas não o modo de falar divino. O Deus da revelação bíblica não se compraz em esmagar bebés contra as rochas. É importante lembrar que o Senhor "'não Se pôs à prova na Bíblia em palavras, em lógica, em retórica"

A dimensão divina da Bíblia

A unidade fundamental dos ensinos da Bíblia aponta para sua natureza divina. Cerca de 40 autores escreveram 66 livros no decorre de um período de 1.600 anos; apesar disso, todos partilham o mesmo ponto de vista sobre criação, redenção e restauração final. Unicamente a inspiração divina poderia garantir a unidade temática subjacente da Bíblia ao longo de séculos cie composição.

Outra indicação da natureza divina da Bíblia é o seu impacto sobre as vidas e sociedades humanas. A Bíblia venceu o ceticismo, o preconceito e a perseguição do mundo romano. Transformou os valores e as práticas sociais das sociedades que lhe abraçaram os ensinos; conferiu um novo valor à vida, imprimiu senso de dignidade à pessoa humana e novo status às mulheres e aos escravos; rompeu com a discriminação social e racial; deu a inumeráveis milhões de pessoas uma razão para viver, amar e servir.

O caráter divino da Bíblia também se revela em sua maravilhosa concepção de Deus, da criação, da redenção e da natureza e destino do homem. Não encontramos essas concepções elevadas nos livros sagrados das religiões pagãs. Nos mitos da criação do Oriente Próximo, por exemplo, os deuses geralmente encontram descanso ou eliminando deuses importunos ou criando seres humanos para trabalhar a hm de que os deuses descansem.

o sábado da criação, porém, Deus encontra descanso não por haver subordinado ou destruído concorrentes nem por haver explorado o trabalho de seres humanos, mas sim porque realizou uma criação perfeita. Deus descansou no sétimo dia porque terminou "a Sua obra" (Gn 2:2, 3). Ele parou de trabalhar como uma expressão de Seu desejo de estar com Sua criação, para dar às Suas criaturas não apenas coisas, mas a Si mesmo. Esse conceito maravilhoso de um Deus que, durante a criação, penetra no tempo humano e, pela encarnação, penetra na carne humana a hm de Se tornar Emanuel, "Deus conosco", acha-se ausente nas religiões pagãs, onde os deuses normalmente compartilham das fraquezas humanas

A notável natureza da Bíblia também se revela em sua miraculosa preservação ao longo da história, apesar dos incansáveis esforços para destruí-la. Já mencionamos as tentativas feitas no passado por imperadores romanos, lideres de igrejas cristãs e regimes comunistas para suprimir a Bíblia. A despeito de todas essas tentativas premeditadas para destruir o Santo Livro, seu texto chegou até nós essencialmente inalterado. Alguns dos mais antigos manuscritos nos aproximam da composição dos originais, revelando a surpreendente exatidão do texto que chegou até nós. Podemos confiar que nossas Bíblias são versões seguras das mensagens originais.  

Por fim, considerações conceituais e existenciais asseguram a validade da Bíblia. Conceitualmente, a Bíblia oferece uma explicação razoável para a condição humana e a solução divina para os nossos problemas. Existencialmente, os ensinos da Bíblia dão sentido à nossa existência e nos oferecem razões para viver, amar e servir. Por meio deles, podemos experimentar as ricas bênçãos da salvação.

CONCLUSÃO

Fizemos um rápido esboço histórico da controvérsia entre a errância e a inerrância da Bíblia. Assinalamos que a Bíblia está sendo atacada hoje por amigos e inimigos. O pêndulo oscila para ambos os extremos. Por um lado, críticos liberais reduzem a Bíblia a um livro estritamente humano, cheio de erros e desprovido de revelações sobrenaturais e manifestações miraculosas. Por outro lado, alguns evangélicos conservadores sacralizam a Bíblia a tal nível que passam por alto a dimensão humana das Escrituras. Eles declaram, solenemente, que a Bíblia não possui erros de espécie alguma, inclusive em todas as suas referências a história, geografia, cronologia, cosmologia, ciência e assim por diante.

No tundo, tanto a inerrância como a errância são posições extremistas e antibíblicas, visto que minam a autoridade da Bíblia, tornando-a ou demasiado humana ou demasiado divina. A solução para esses extremos se encontra na palavra-chave equilíbrio — equilíbrio que reconheça o caráter tanto divino quanto humano da Bíblia.

A seu modo. o catolicismo minou a autoridade da Bíblia ao declarar que seus ensinos tradicionais representavam a "viva transmissão" da Palavra de Deus. Isso possibilitou que a Igreja Católica, ao longo dos séculos, promulgasse grande número de ensinamentos antibíblicos, responsáveis em grande parte por conduzir inúmeros cristãos à apostasia. A Igreja Adventista do Sétimo Dia tem historicamente defendido uma concepção equilibrada sobre a Bíblia, reconhecendo o seu caráter tanto divino quanto humano. Os adventistas creem que a Bíblia é produto de uma misteriosa mistura de participação divina e humana. A fonte é divina, os escritores são humanos, mas os escritos contêm pensamentos divinos em linguagem humana. Essa combinação singular nos oferece uma revelação confiável e infalível da vontade de Deus, e um plano para a nossa vida presente e destino futuro. Conforme está declarado nas crenças fundamentais adventistas do sétimo dia: "As Escrituras Sagradas são a infalível revelação de Sua vontade. Constituem o padrão de caráter, a prova da experiência, o autorizado revelador de doutrinas e o registro fidedigno dos atos de Deus na história."

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